Maria Sylvia foi entrevistada pelo professor Floriano de Azevedo Marques Neto
Edição: Kaco Bovi
A história da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco é construída principalmente por sus professores e alunos que por ela passaram (e passam) todos os dias. Trazer o resgate desse legado é um dos objetivos do “Projeto Memórias”, uma parceria entre a Fundação Arcadas e a Faculdade de Direito da USP, que consiste em entrevistas de docentes feitas pelos próprios docentes.
A entrevistada desse episódio é com a professora Maria Sylvia Zanella di Pietro, um dos principais nomes do Direito Administrativos. Ao docente Floriano de Azevedo Marques Neto, ex-diretor da FDUSP (que no concurso para professor titular herdou sua cadeira), ela conta parte de sua trajetória, desde o ingresso, passando pelos passos de formação em Direito à docência.
No bate-papo fez uma confissão: “Na minha adolescência, jamais pensei em ser advogada”. A docente recordou, também, que o ministro aposentado Celso de Mello foi seu calouro. “Foi um dos grandes ministros do STF”.”
Contou, que apesar de ter sido orientanda do professor José Cretella Júnior, o tema da “servidão administrativa” foi sugerido pelo professor Dalmo de Abreu Dallari.
Sobre sua relação com o professor Cretella assinalou que este sempre foi um grande orientador. “As orientações que ele deu, sempre foram muito boas”.”
De início disse que não gostava de dar aulas, mas aos poucos foi tomando gosto até se tornar uma das principais professoras na matéria.
Entre os livros que usava para preparar as aulas informou que tinha como base os Cretella, Celso Antonio e Heli Lopes Meirelles.
Falou dos concursos que disputou. Revelou que a banca para ingresso tinha entre os professores nomes de peso, como Manoel Gonçalves, Dalmo Dallari e Rubens Limongi. “Era uma banca difícil”, rememorou.
Acerca de sua relação de autonomia com o direito administrativo, relatou que teve dois grandes professores: Whashington de Barros Monteiro e Sílvio Rodrigues. “Até hoje tenho os livros deles. Não tenho coragem de me desfazer desses livros que me deram uma grande base em Direito Civil”, disse. “Eu sempre disse para meus alunos: ‘se vocês não souberem a parte geral do Direito Civil, vocês não sabem nada porque se aplica em todos os ramos do Direito’.”
Floriano Marques lembrou que quando a substituía nas aulas de Graduação e ela sempre lhe deu liberdade. Nesse sentido disse ter sido influenciada por seus pais.
Sobre a timidez inicial na carreira, analisou ter sido uma das maiores vitórias de sua vida. “Costumo dizer que sou uma contradição comigo mesma”.
Questionada sobre qual a visão da Faculdade e o que ela representou, observou que a SanFran fez parte de sua vida por mais de 50 anos. “Dei aula, aqui, por 33 anos e tenho o maior respeito por essa instituição. Uma coisa que sempre me impressionou foi o que ela representa até hoje. Continuo achando uma coisa fantástica a história dessa faculdade. Isso tudo me cativou de uma maneira impressionante”, adicionou.
A falta de professoras, especialmente titulares, é uma preocupação de Maria Sylvia. No entanto, disse nunca ter sido discriminada por ser mulher – tanto na docência quanto como procuradora. Mas faz um adendo: “Se eu tivesse tido filhos, teria conseguido ter feito tudo que fiz? Acho pouco provável”.
Para ela, neste momento, o Direito Administrativo está muito bem, mas se disse muito preocupada com a matéria no futuro, por conta da Inteligência Artificial Generativa. “Se não for controlada, vai ser um desastre”, disse. “Vejo que muitos professores dos EUA estão pessimistas. Tem um que diz que a IA é a última inovação da humanidade, outro que diz que a IA está avançando sem controle e que ninguém ainda encontrou a fechadura. Fico muito preocupada. As normas que têm saído do CNJ, da AMB, da OAB alertam para isso. A preocupação geral é com essas mudanças que não sei como se vai controlar”.”
A questão amplia a preocupação da docente especialmente no quesito segurança jurídica que pode ser afetada. “Acho que o Direito administrativo não pode conviver com a insegurança, com a incerteza do Direito. É um risco muito grande. Eu prefiro ainda a inteligência humana”. E citou algumas instituições ‘admiráveis’ criadas pelos humanos. “É a genialidade do ser humano, a máquina não pode fazer a mesma coisa”.”
Maria Di Pietro é mestre (1971-1973) e doutora em direito (1977-1982) pela FDUSP, ambos os títulos sob orientação de José Cretella Júnior. Em novembro de 1984, tornou-se professora doutora da FDUSP, livre-docente em 1988. Foi chefe do Departamento de Direito do Estado de 2006 a 2009.
Em 1970 foi nomeada Procuradora do Estado de São Paulo, cargo no qual auferiu o prêmio "Procurador do Ano", conferido pela Associação dos Procuradores do Estado de São Paulo em 1999. Também integrou a comissão de juristas que elaborou a lei de normas gerais de processo administrativo da União Federal (Brasil).
Confira. Reverbere: https://youtu.be/ijsNXCPNqt0?si=dE-lpVBorr3gbUyR
Projeto Memórias
O Projeto Memórias foi concebido em 2024 como uma parceria entre a Faculdade de Direito da USP e a Fundação Arcadas visando a preservar visualmente a história da Instituição por meio do depoimento de seus professores sêniores, que ajudaram no passado recente a alicerçar seu destaque no cenário jurídico-acadêmico, o que ocorre ao longo de quase dois séculos. O Projeto buscou também preservar certo grau de intergeracionalidade por intermédio dos entrevistadores, predominantemente docentes que hoje se encontram em plena atividade acadêmica.
O foco é conhecer melhor a relação de cada um desses docentes com a Faculdade, seja enquanto aluno, caso tenha sido, seja como professor de destaque dos cursos de Graduação e Pós-Graduação ministrados, e como gestor da Instituição, se isso tiver ocorrido. Por meio de seu depoimento busca-se identificar como era o ambiente acadêmico de sua época de aluno ou de docente, seus relacionamentos com os demais componentes da Faculdade, alunos, servidores e demais professores, e as relações pessoais daí decorrentes.
Os depoimentos dos docentes permitirão que a sociedade conheça um pouco mais da história recente desta Faculdade, que possui o destaque ímpar de ter tido dentre seus alunos 13 presidentes da República, o que é um legado à história brasileira. Além disso, muitas das teorias jurídicas disseminadas no Brasil tiveram sua gênese nesta vetusta Academia, várias delas criadas ou veiculadas pelos docentes que fazem parte do Projeto.
Por meio desta iniciativa, a Diretoria da Faculdade de Direito e a Diretoria da Fundação Arcadas buscam recuperar e preservar parte da recente memória jurídico-acadêmica nacional.
Diretoria da FDUSP
Celso Campilongo
Ana Elisa Bechara
Diretor-Executivo da Fundação Arcadas
Fernando Facury Scaff
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