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Emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido: roubo majorado ou qualificado?

Luciano Anderson de Souza, Professor Associado do Departamento de Direito Penal, Medicina Forense e Criminologia da Faculdade de Direito da USP

 

Resumo

A Lei Anticrime insculpiu previsão no Código Penal segundo a qual, se o crime de roubo for praticado mediante emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido, aplica-se em dobro a pena prevista no caput do art. 157. O referido dispositivo tem sido considerado como nova causa de aumento de pena do delito. Contudo, cuida-se de nova qualificadora, consideração que traz consequências práticas fundamentais à pena final a ser estabelecida ao condenado.

 

Com a Lei Anticrime (Lei 13.964/2019), criou-se um § 2º-B ao art. 157 do Código Penal, que estabelece: “se a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido, aplica-se em dobro a pena prevista no caput deste artigo”.

A má técnica legislativa vem levando a erro parcela significativa da doutrina a respeito do tema[i]. Neste caso, apesar da redação legal a princípio ser característica de causa de aumento, também chamada majorante, uma vez que se refere a um percentual de aumento punitivo, perceba-se que, em realidade, se cuida de uma qualificadora.

Isso porque uma qualificadora, que consiste em um subtipo penal mais gravoso, possui sanção própria, com margens mínima e máxima mais recrudescidas que a da figura fundamental (como a do homicídio qualificado, art. 121, § 2º, do Código Penal, que possui pena de 12 a 30 anos, mais significativa que a do homicídio simples).

Uma causa de aumento de pena, por sua vez, consiste em uma circunstância à qual se atribui patamares de majoração incidentes na última fase do sistema trifásico de aplicação de pena (após as etapas de cálculo referentes, em primeiro lugar, às circunstâncias judiciais[ii] e, em seguida, legais)[iii]. Dessa forma, em geral, majorantes possuem consequências punitivas mais severas que qualificadoras, pois podem levar a sanção a patamares superiores ao máximo cominado em abstrato. Exemplo de causa de aumento de pena encontra-se no art. 121, § 6º, que aumenta a pena do homicídio de 1/3 até a metade se o crime for praticado por milícia privada, sob o pretexto de prestação de serviço de segurança, ou por grupo de extermínio.

Ao modificar o sancionamento do roubo cometido com emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido, desrespeitando a melhor técnica, a Lei Anticrime fixou: “aplica-se em dobro a pena prevista no caput deste artigo”. Caso não tivesse vinculado o “aumento” ao caput do art. 157, tratar-se-ia de causa de aumento de pena, incidente no cálculo final do sistema trifásico.

Se essa era a intenção, o legislador não conseguiu tal efeito, porque a menção à pena do caput vinculou necessariamente a duplicação à pena em abstrato, e não à decorrente após os dois primeiros cálculos da sistemática de aplicação de pena, conta que seria impossível. Não se mostra logicamente possível dobrar a pena abstratamente prevista no caput após o cálculo decorrente de pena-base fixada, sobre a qual, eventualmente, se incidiu circunstância agravante e/ou atenuante.

Em outros termos, não é tecnicamente concebível uma majorante aumentar pena da primeira fase, estabelecida abstratamente no “caput” de qualquer dispositivo penal, mas apenas da pena-provisória oriunda da segunda etapa do sistema trifásico de aplicação de pena. A leitura do dispositivo que tem prevalecido na doutrina carece de sentido.

Não se pode fingir que o dispositivo não se referiu à pena em abstrato (“pena prevista no caput” refere-se à 1ª fase do cálculo da pena), sendo completamente fora de propósito, reitere-se, após a consideração das circunstâncias agravantes e atenuantes, o aplicador da pena voltar à pena do caput do art. 157 e dobrá-la. Tampouco é aceitável se dobrar a pena-provisória, pois não é isso que está escrito no dispositivo, não contendo a lei palavras inúteis.

Ocorre que, pela tradição legislativa jurídico-penal brasileira, a Lei Anticrime deveria ter atribuído à circunstância referida a pena de “reclusão, 8 a 20 anos, e multa”, única forma de se interpretar corretamente a parte final do novo § 2º-B. Desta feita, trata-se de uma nova qualificadora estabelecida ao delito de roubo, ao lado de outras duas já existentes (roubo seguido de lesão corporal grave e latrocínio, conforme previsto nos incisos I e II do § 3º do art. 157).

De todo modo, criou-se hipótese qualificadora com efeito punitivo em tese mais gravoso que o estabelecido pela citada Lei  13.654/2018, que passou a majorar em 2/3 (dois terços) a pena, qualquer que fosse a arma de fogo utilizada para o roubo, como visto.

A partir de agora, se a arma de fogo empregada no roubo for de uso restrito ou proibido, conforme o teor do art. 3º, parágrafo único, incisos II e III, do Anexo I do Decreto 10.030/2019 (Regulamento de Produtos Controlados), modificado pelo Decreto 10.627/2021, incide o novo § 2º-B do art. 157, qualificadora com pena do caput duplicada. Nos demais casos, isto é, se a arma de fogo for de uso permitido (conforme o art. 3º, parágrafo único, do decreto citado), permanece a incidência do art. 157, § 2º-A, inciso I, enquanto majoração de 2/3 (dois terços) que recai sobre a pena alcançada após os dois primeiros cálculos do sistema trifásico.

É de se notar, então, não ser possível aplicar a pena base a partir do fixado pelo § 2º-B (por ter o roubo sido perpetrado com emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido) e, ao final, na terceira fase, também incidir majoração de 2/3 pelo emprego de arma, pois tal representaria dupla punição pelo mesmo fato (bis in idem).

Por fim, quanto à sanção deste novo § 2º-B, de 8 a 20 anos de reclusão, e multa, como visto, há afronta ao princípio da proporcionalidade. Embora se possa, em tese, admitir uma diferenciação entre a punição ocorrente pelo emprego de arma de fogo de uso restrito ou proibido em face de outras situações, inclusive do emprego de outros armamentos menos ofensivos, a pena estabelecida mostra-se bastante exagerada, sendo, e.g., mais grave que as do homicídio simples (reclusão, de seis a vinte anos), aborto provocado por terceiro sem o consentimento da gestante (reclusão, de três a dez anos) ou estupro (reclusão, de 6 a 10 anos).

Todo esse quadro atentatório à sistemática jurídico-penal, lamentavelmente, não é novo. Ele decorre da fúria legiferante embebida de populismo punitivo, de cunho meramente simbólico, que graça há mais de três décadas no Brasil e não ostenta o menor sinal de desgaste político. De lá para cá, os resultados disso tudo têm sido apenas a deslegitimação do ramo jurídico-penal, o aumento do arbítrio das instâncias de controle social formal e o agravamento da desumanidade e do irracionalismo do cárcere, alçado à condição de gestor da miséria e “sócio” do crime organizado. Visto que recrutador de novos “soldados” para a criminalidade, selecionados dentre os marginalizados de sempre, os presídios consagram verdadeiro círculo vicioso de violência, cujo principal patrocinador é o Estado.

 

Notas de rodapé

1 O mesmo problema se apresenta diante da redação dada ao art. 180, § 6º, do Código Penal, pela Lei 13.531/2017. Curiosamente, alguns autores são contraditórios, entendendo que em um caso seria qualificadora e em outro majorante, sendo que a redação é similar.

2 Previstas no art. 59 do Código Penal.

3 Agravantes, insculpidas nos arts. 61 e 62 do Código Penal, e atenuantes, fixadas nos arts. 65 e 66 do mesmo diploma.

Referências

ROIG, Rodrigo Duque Estrada. Aplicação da pena: limites, princípios e novos parâmetros. São Paulo: Saraiva, 2013.

SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

SOUZA, Luciano Anderson de. Direito penal: parte geral. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2021, v. 1.

SOUZA, Luciano Anderson de. Direito penal: parte especial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2021, v. 3.

WACQUANT, Loïc. Punir os pobres: a nova gestão da miséria nos Estados Unidos [A onda punitiva]. Trad. Sérgio Lamarão. Rio de Janeiro: Revan, 2007.

ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Em busca das penas perdidas: a perda da legitimidade do sistema penal. Trad. Vania Romano Pedrosa e Almir Lopez da Conceição. Rio de Janeiro: Revan, 1991.

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