Edição: Kaco Bovi
Emocionado, o ministro Ricardo Lewandowski, professor de Direito do Estado da Faculdade de Direito da USP, tomou o palco das Arcadas, tradicional espaço de debates, para uma aula sobre democracia. Observado por alunos, docentes autoridades, e demais presentes, ressaltou a importância de o Brasil se manter vigilante nas garantias dos direitos de seu povo.
“Não é fácil falar neste pátio sobre democracia, nesse 11 de agosto, nas tradicionais Arcadas de onde partiram, ao longo de dois séculos, inúmeros movimentos libertários que despertaram o País das trevas da autocracia e do autoritarismo”, assinalou, dirigindo-se aos diretores da FDUSP, Celso Campilongo e Ana Elisa Bechara.
Adiante citou dois momentos fundamentais de luta, vividos no local. “Eu diria que é quase uma temeridade falar de onde foi lida (por Goffredo da Silva Telles, em agosto de 1977), a Carta aos Brasileiros em que expressava o repúdio da sociedade à Ditadura Militar e exigia eleições diretas, bem como a convocação de uma Assembleia Constituinte”, ressaltou. “E, também, uma temeridade, onde foi lida, em 11 de agosto de 2022, no momento de grave perigo para as instituições brasileiras, outra Carta em que a comunidade Acadêmica e os pensadores, democratas brasileiros, manifestavam sua preocupação com ataques às urnas eletrônicas; e, também, exigia que se celebrasse eleições livres e transparentes naquela antevéspera de um pleito nacional”.
Durante sua fala, adicionou que o tema democracia passou a ser um relevante, sobretudo, em face dos perigos que ela enfrentou num passado recentíssimo. Nessa direção delineou os passos das Constituições republicanas, desde 1891, sem o viés democrático que chegou somente com a de 1988. “Essa (de 1988) a pensar na dignidade da pessoa humana. Esse Estado Democrático de Direito, além de ter como fundamento a dignidade da pessoa humana, e prestigiar os direitos fundamentais. E tem características extremamente importantes, uma vez que amplia a participação dos cidadãos na gestão da coisa pública”.
Citou também o pensador Roberto Bobbio e centrou boa parte de sua exposição na obra “Como as Democracias Morrem”, dos professores Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, de Harvard. “A obra lança luz sobre os processos de erosão e ruptura das democracias. E os atores demonstram como as democracias podem ser e, frequentemente, são subvertidas por dentro, pela atuação de líderes e atores, com tendencias autoritárias ou populistas, que acabam por sufocar a liberdade.”.
De acordo com ele, essas lideranças, para imporem seus desígnios autocráticos, não lançam mais mão de golpes tradicionais, empregando as forças armadas, colocando tropas e tanques nas ruas. “A morte das democracias ocorre por medidas travestidas de intenções nobres, como o combate à corrupção, a defesa da segurança nacional; sempre dentro do arcabouço legal existente. E, não raro, avalizados por instituições, como o próprio parlamento e, mesmo, o poder judiciário”. “Esse livro é leitura recomendável para nós, eternos estudantes do Direito”, acrescentou.
Lewandowski lembrou ainda que no Brasil houve uma tentativa de ruptura institucional por dentro das instituições, com métodos análogos e sem o emprego ostensivo ou incitamento militar. “Aqui, o processo foi mais sutil”.
“Passamos pelo ataque a eficiência das urnas eletrônicas e, por consequência, ataques à própria Justiça Eleitoral, onde se buscou minar o pleito que se travou no ano passado”, asseverou.
E relatou que esse processo fez crescer um discurso nacionalista exacerbado e anacrônico que conseguiu impor um clima de “Nós contra eles, do verde e amarelo contra o vermelho”. “Vimos crescer um discurso de ódio e de exclusão, uma intensa disseminação de notícias falsas contra os adversários, num verdadeiro assassinato de reputação. Vimos crescer também a corrupção e a criminalidade”.
Sobre 08 de janeiro, tratou como um dia terrível para a Nação, para a História do Brasil, para a Democracia que imaginávamos consolidada. “Todos vimos, estupefatos, a invasão aos Prédios dos Três Poderes”, disse. “Participei daquele evento memorável em que o presidente da República convocou os 27 governadores de Estado e do DF, os ministros e outras autoridades. Descemos a rampa do Planalto e nos deparamos com aquele cenário de guerra na Praça dos Três Poderes. Algo inimaginável”, avaliou.
“Mas a Democracia brasileira, felizmente, sobreviveu a esse revés. Nós temos uma boa Constituição, temos instituições republicanas resilientes, que sobrevivem e resistem às inúmeras crises”, finalizou.
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