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Em seminário, juristas destacam o legado de Tullio Ascarelli e Norberto Bobbio para o Direito e para a sociedade

 

Edição: Kaco Bovi

 

A Sala da Congregação da Faculdade de Direito da USP teve presença maciça de estudantes, docentes, juristas e demais convidados para assistir à palestra do professor Emérito Celso Lafer (DFD-FDUSP), no encerramento do simpósio “Tullio Ascarelli e Norberto Bobbio – Presenças na Itália e no Brasil”. Organizado pela instituição, o evento buscou discutir (ao longo de três dias) a importância de Ascarelli e Bobbio para ambos os países, tanto no ordenamento jurídico quanto nas questões democráticas e sociais, com exposições de italianos e brasileiros.

Lafer dividiu sua exposição em eixos. Fez menção ao relacionamento Bobbio – Ascarelli; em seguida realçou a presença dele no Brasil, sua recepção do campo da filosofia no Direito, as conferências dele na Faculdade e o que as remetem às suas obras. E, por fim, o motivo pelo qual a ideia de Bobbio dá uma dimensão operativa à prática do Direito e por qual razão isso é útil para todos. “É preciso enfatizar o estilo e o método de Bobbio, a clareza conceitual e os conceitos com os quais ele trabalha”, disse.

Na mesma linha acentuou caminhos que levam à saída de labirintos normativos, que é o que Bobbio procura fazer sobretudo sobre a paz e a guerra. “Ele diz que a razão do Direito não é aquela razão que dá conta de tudo; mas uma razão que usa, a cada caso concreto, as regras da lógica, da pragmática e todas as disciplinas que têm por objeto operações mentais que se inserem no conceito do raciocínio, uma racionalidade circunscrita”, afirmou. Acrescentou que obra de Bobbio é referência no caminho para compreensão da Itália, com seus vários trabalhos e a experiencia de quem viveu e combateu tempos rudes como o fascismo.

Por sua vez, o diretor da SanFran, professor Celso Campilongo, ressaltou que a exposição de Lafer demonstra a enorme contribuição de Bobbio para o Direito. E agradeceu o apoio do Consulado da Itália, da Academia Paulista de Direito, da Fundação Getulio Vargas, do Instituto Noberto Bobbio, da Universidade de Firenzi e de outras instituições envolvidas na organização do seminário.

 

Aclamação

Em um dos painéis, a professora Paula Forgioni, Direito Comercial da FDUSP, abordou o trabalho de Ascarelli no ordenamento jurídico brasileiro. “Ele não trouxe o Código Italiano para cá. Não veio colonizar ninguém. Ao contrário. Talvez por isso tenha sido tão aclamado aqui”, assinalou.

De acordo com ela, Ascarelli entendeu como funcionava o direito brasileiro e trouxe uma ideia de sistema, para trabalhar a lógica do Direito comercial como poucos. “Foi o primeiro, aqui, que identificou empresa como um agente econômico. E fala da ideia de mercado”, acrescenta.

Forgioni deu como dica aos participantes fazer uma leitura do livro “Panorama do Direito Comercial”, em que Ascarelli fala aponta para essa ideia de mercado. “Ele vê a empresa com uma organização”.”

O professor italiano Francesco D’Angelo, da Università di Firenze, destacou que Ascarelli foi um jurista universal. “As reflexões de Ascarelli constituem um patrimônio inestimável para quem tem ou cultivou alguma paixão pelo Direito Comercial e, antes disso, para o Direito como um todo”, afirmou. Em sua exposição, tratou de elementos sobre acordos comerciais, de consórcios e cartéis e citou muitas obras do italiano.

Ruy Camilo (DCO-FDUSP) realçou “a homenagem a um dos professores mais marcantes da faculdade, um homem perseguido que não se desencorajou; e, proibido de dar aula na Itália, foi acolhido nessa casa”. E adicionou: “Aquele que estende a mão, muitas vezes, é acolhido. Recebemos Ascarelli e, em troca, ele marcou toda uma geração de intelectuais brasileiros”.

Luís André de Azevedo, da FGV, avaliou que fica a visão mais ampla desses juristas progressistas. De acordo com ele, a lição que fica é entender a contribuições de homens que buscam adequar o Direito com a sua realidade. A visão de teoria e prática no sentido de promover a evolução contínua do Direito; seja do ponto de vista da interpretação na técnica de hermenêutica de Ascarelli, seja do ponto de vista da democracia da jusfilosofia de Bobbio”, afirmou.

Alfredo Attiè, da Academia Paulista de Direito, reforçou, referindo-se a Lafer: “Não se enganem, quando forem visitar os textos de Bobbio não encontrarão essa clareza de exposição, esse empenho na capacidade de explicar e esse estilo”.

Celso Azzi, do Instituto Noberto Bobbio, destacou a importância dos juristas italianos e adicionou que a vinda dos professores da Faculdade de Firenze promoveu um novo relacionamento entre Brasil e Itália que passa a ter como laço italiano a Universidade de Firenze. “É o começo de um marco”.

 

Fúria dos extremos

Celso Campilongo sintetizou que, ao abrir o seminário, foi citado que o Instituto Norberto Bobbio está para receber as correspondências trocadas entre Bobbio e Ascarelli. “Não conheço essas cartas, mas posso dizer que, com certeza, duas palavras aparecem: Paz de um lado e democracia de outro”, assinalou. Reforçou que Lafer tem vários escritos sobre Bobbio, em que menciona períodos em que se vive a fúrias dos extremos. “Essa fúria dos extremos são momento de radicalismo, com por exemplo, o radicalismo que havia na Europa durante o nazifascismo, período de guerra, de ausência de paz, que fez com que Ascarelli viesse ao Brasil”.”

O diretor acrescentou que outra palavra na correspondência entre esses dois intelectuais (a democracia), Bobbio se fez presente na realidade brasileira exatamente no momento de retomada da democracia no Brasil. “Penso que esses dois autores e esse seminário, independentemente dos vários pontos em comum entre Bobbio e Ascarelli, apontam na direção de como se evitar a fúria dos extremos. Isso me parece relevante num momento como o atual, de discurso de ódio, de guerra, de exasperação de fúria nos extremos. Nesse momento é preciso paz e democracia, nada melhor como pensadores da grandeza de Bobbio e Ascarelli”, finalizou.

 

Biblioteca

Ainda em sua fala, Celso Lafer aproveitou para se recordar de momentos vividos com Bobbio. Entre os quais, uma visita do jurista italiano em que teve a oportunidade de apresentar sua biblioteca, enriquecida pelos trabalhos dele. “O acesso à bibliografia era um desafio muito mais importante e, na minha biblioteca, constava enorme bibliografia de Bobbio”, disse. “Um dos primeiros livros dele publicado no Brasil (‘A teoria das formas de governo da história do pensamento político), fiz o prefácio e ressaltei a defesa da liberdade no caminho intelectual de Bobbio”.

Adiante, Lafer disse que Bobbio, tanto na teoria da norma quanto na teoria do ordenamento se dedica a explicar os temas fundamentais, do que é Direito e o que não é Direito. O que é a hierarquia das normas, como se resolve o conflito entre normas e como lidar com a interação entre distintas ordens jurídicas. E tratou de dois conceitos clássicos do direito privado: reenvio ou recepção. “Ou você manda o problema para o outro ordenamento ou recepciona no seu próprio ordenamento”, afirmou.

 

As palestras podem ser conferidas no canal do YouTube da FDUSP.

Assista, compartilhe: https://encurtador.com.br/ilPZ4

 

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