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Cem anos da morte de Ruy Barbosa

Por Rodrigo Pacheco, advogado, presidente do Senado Federal

 

Ruy Barbosa é, até os dias de hoje, o político jurista mais notável da história nacional. Nascido na Bahia, em 1849, faleceu há exatos cem anos, em 1.º de março de 1923, no exercício de seu quinto mandato como senador da República. O baiano foi recordista de mandatos legislativos: passou 45 anos de sua vida no exercício de cargos eletivos, sendo 32 deles no Senado Federal. Dizia que “o senador é a personificação eletiva de um Estado”, ao ponderar que a Câmara Alta era composta de representantes da Federação.

 

Barbosa foi tanto para o desenvolvimento da República brasileira que é difícil de elencar tudo o que realizou sem cometer a injustiça de deixar algum feito no esquecimento. Ruy viveu muitas vidas em uma, além de colecionar postos públicos de grande relevância e de deixar como legado muitas reflexões que até hoje se fazem oportunas. Foi advogado, jornalista, diplomata, orador, ministro da Fazenda e da Justiça, deputado, senador na primeira legislatura da República, candidato à Presidência do Brasil, coautor da primeira Constituição republicana, membro fundador da Academia Brasileira de Letras e representante do Brasil na Conferência de Haia, o que lhe rendeu o apelido de “Águia de Haia”.

 

Patrono do Senado Federal, do Tribunal de Contas da União e da advocacia brasileira, é lembrado em tribunais, em discursos políticos e em faculdades de Direito no Brasil inteiro. Reconhecimento merecido e justo. Afinal, foi Barbosa quem estabeleceu os pilares da República Democrática de Direito do nosso país, dedicou-se a criar uma consciência política na população brasileira e atuou fortemente em projetos que visavam à melhoria da qualidade do ensino no Brasil.

 

No Senado Federal, o baiano só deixou a Casa quando veio a falecer, aos 73 anos de idade. É uma figura tão distinta para o Poder Legislativo brasileiro que seu busto reside solitário no plenário da Câmara Alta brasileira, acima da Mesa. É uma espécie de guardião das leis da nossa República, exercendo até hoje o papel que se dispôs a realizar em vida. Estava lá, inclusive, quando as sedes dos Poderes da República foram invadidas em 8 de janeiro de 2023, dia triste e marcante para a nossa República, mas se manteve firme, assim como nossa democracia.

 

Aliás, sobre o regime democrático, Barbosa foi seu defensor, por considerar que a democracia representa poder do povo, igualdade e progresso. De fato, é dele a brilhante frase “o princípio do futuro é a democracia”. Hoje, quando olhamos para o nosso passado, podemos ver claramente que governos autoritários representaram retrocessos e que a democracia simboliza avanço civilizatório, de modo que, sim, podemos dizer que o começo do progresso é o estabelecimento de um governo democrático, e que Barbosa estava certo.

 

Além de defender a democracia, a “Águia de Haia” alertou para a necessidade de respeitar a legislação. O patrono do Senado é autor de uma célebre frase que resume a necessidade de submissão ao Estado de Direito, ao defender que é necessário agir “com a lei, pela lei e dentro da lei; porque fora da lei não há salvação”. Barbosa concluiu que esta lição, relativa ao respeito às leis, era “o programa da República”.

 

Grande orador, era conhecido por proferir discursos inflamados, e usou a tribuna do Senado diversas vezes para pronunciar verdadeiras aulas de política. O conteúdo de sua oratória era tão rico que, até hoje, sua vida e obra são objeto de pesquisa do Setor Ruiano. No plenário do Senado Federal, em 1911, mostrou que usava a palavra e o direito como armas de sua luta por um país justo e igualitário. Disse: “Não podia trazer a esta tribuna nem uma carabina nem uma espada. Trago ao recinto dos legisladores apenas um volume das nossas leis. Infelizmente bem fracas nestes tempos, têm sido sempre a minha única arma”.

 

Em Oração aos moços, seu discurso mais famoso, que escreveu como paraninfo de formatura da turma de 1920 da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, Barbosa confidenciou: “Tudo envidei por inculcar ao povo os costumes da liberdade e à República as leis do bom governo, que prosperam os Estados, moralizam as sociedades e honram as nações. Preguei, demonstrei, honrei a verdade eleitoral, a verdade constitucional, a verdade republicana”.

 

Barbosa foi um divisor de águas na política brasileira, trabalhando arduamente para plantar uma semente de consciência político-eleitoral na população brasileira. Para tanto, defendia a necessidade de que a população tivesse acesso à educação e à imprensa. Dizia que “os meios de educar a opinião não são outros senão a escola e a imprensa, dois sacerdócios sublimes”. É notório que o jurista tinha pautas que transcenderam o seu tempo e estão presentes no debate hodierno, o que comprova a genialidade do patrono do Senado da República.

 

Por tudo o que representou para o Parlamento brasileiro e para o Brasil, o Senado Federal realizará, às 10 horas deste 1.º de março, sessão solene em homenagem aos cem anos da morte desta personalidade que viveu à frente de seu tempo e cujos ensinamentos ecoam nos ambientes jurídico e político até a atualidade.

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